Mais um final de tarde na Cidade Cinza. Vago pela mesma rua de sempre, fugindo do vento que não me deixa acender meu cigarro. Passo no mesmo boteco e pego minha cerveja. Desta vez nem quis ouvir os pedidos do dono do bar para que eu apagasse o cigarro. Peguei a bebida e atirei várias moedas sobre o caixa, sem nem esperar que o patife conferisse se o dinheiro estava correto ou se eu teria troco. Voltei para rua e vi que meu velho banco estava ocupado por um mendigo. Achei melhor deixar o pobre desgraçado lá e fui à busca de outra praça. Encontrei uma perto e ali me estabeleci. Aquilo foi um alívio para minha já castigada coluna, por mais que eu nem tenha bem passado dos 20 anos.
Por mais cinzento que estivesse o céu, foi possível enxergar o pôr do sol. Fiquei ali sentado, eu, meu cigarro, minha cerveja (que já estava quente) e meu velho caderno. Observando os carros, as pessoas e aquelas imundas pombas, pensei sobre o caminhar das coisas na vida. Calculei o preço de viver, subtraindo todo o revés que ela traz, somando todas as “dádivas” que surgem do nada (mais obra da desatenção do azar do que de uma possível sorte). Fazia e refazia as contas, sempre buscando um resultado positivo, por mais que a calculadora não compreendesse que poderia ser o momento de me ceder um valor acima de zero. Depois de vigésima segunda tentativa, chutei a tal calculadora para rua e um caminhão só terminou o serviço, a despedaçando da mesma forma que ela mesma faz com as esperanças de tranquilidade da minha cabeça.
Peguei a garrafa de cerveja, já vazia e quebrei-a no banco, deixando ali uns míseros cacos, já que a coragem de fazer qualquer outro ato de rebeldia já se perderá desde aquele fatídico final de semana de agosto. Voltei minhas mãos para o bolso da calça, peguei o último cigarro e voltei para casa, com mais dúvidas, questionamentos, choramingo e tristeza do que a maldita hora que inventei de sair para comprar álcool e tomar um ar.